agosto 30, 2006

Justiça busca padrão para pirataria

Mais uma do Jornal Valor Econômico: A Justiça brasileira ainda não conseguiu definir um padrão para estipular valores de indenização que realmente sirvam para punir quem viola marcas e patentes e, assim, inibir a pirataria.

A ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Nancy Andrighi, presidente da terceira turma da corte, disse ontem no "XXVI Seminário Nacional da Propriedade Intelectual" em Brasília que os avanços têm sido milimétricos dentro dos tribunais - mas existem. Um deles começa a aparecer na própria jurisprudência, com decisões que estipulam não só indenizações materiais mas também por danos morais pelas infrações.

Um bom exemplo citado pela ministra foi uma decisão tomada pela terceira turma do STJ que deu vitória à Louis Vuitton em 2003 contra uma pequena loja que vendia bolsas falsificadas da marca. A empresa teve que pagar uma indenização material no valor obtido pelo número de bolsas falsificadas multiplicado pelo preço da própria bolsa nas lojas Louis Vuitton e ainda uma indenização de R$ 50 mil por danos morais. Apesar de decisões como esta começarem a aparecer, os valores ainda são muito subjetivos e há muita dificuldade em se obter provas que ajudem nesse cálculo.

Nos Estados Unidos, por exemplo, as indenizações são calculadas com base em quatro critérios. O primeiro deles é a perda de lucro decorrente da venda dos produtos pirateados. Segundo explicou o juiz da Corte de Apelação dos Estados Unidos em Washington, Randall Rader, o cálculo é feito com base no lucro que o contrafator teve ao vender os produtos falsificados.

Mas a empresa precisa provar que teria capacidade produtiva para vender a mesma quantidade de produtos pirateados apreendidos para que esse valor faça parte do cálculo, segundo o juiz americano. Se a empresa não tiver essa capacidade de venda, então a indenização ainda pode ser estabelecida por meio de royalties, como se o produto pirata fosse licenciado.

Além disso, os danos materiais são calculados ainda com base na erosão do preço provocada pelo produto falsificado, já que os piratas vendem a baixo custo e alteram o valor de mercado das marcas.

O quarto e último ponto é a perda de receita com a venda de produtos agregados. O juiz citou o exemplo de uma raquete de tênis que não é vendida sozinha, pois as bolsas para carregá-la são vendidas junto.

Para que esse cálculo seja feito são exigidas provas, o que fez a ministra Nancy Andrighi indagar como elas são produzidas, dada a dificuldade existente no Brasil. O juiz Randall Rader explicou que não somente os fatos são importantes para a comprovação, mas também são chamados a se pronunciar nos processos especialistas econômicos que avaliam o mercado e o impacto que o produto falsificado trouxe para determinada empresa que pleiteia a indenização.

O juiz brasileiro da 3ª Vara de Fazenda Pública, André Andrade, estudioso do assunto, diz que no Brasil não há previsão expressa na lei sobre indenizações punitivas. Os próprios danos morais, por exemplo, são tratados por muitos magistrados como inaplicáveis a empresas. "Há casos, entretanto, que indenizações reparatórias não são suficientes para cessar o delito e a receita ilícita", disse o juiz.

Ele deu como exemplo um caso que julgou durante a Copa do Mundo de 1994, em que a Brahma usava a imagem da seleção brasileira em que os jogadores apareciam fazendo o número 1 com a mão, que marca a propaganda da Brahma. A Confederação Brasileira de Futebol se sentiu lesada e pediu a reparação. O juiz determinou o pagamento não só dos danos materiais como também morais, que seriam estabelecidos pelo dobro do valor da indenização material. Mas a corte de segunda instância manteve apenas os danos materiais.

Um dos poucos casos em que a legislação estabelece valores é no caso da Lei de Direitos Autorais, que estabelece o pagamento de três mil vezes o valor do produto violado. Essa lei, que abrange especialmente o direito de escritores, tem sido usada analogamente por juízes brasileiros em casos de produtos falsificados.

A medida é muito bem vista por advogados, mas no próprio STJ a questão não é clara, e por isso os membros do Conselho Nacional de Combate à Pirataria fizeram uma minuta de projeto de lei propondo a majoração de valores de indenizações, segundo o presidente da Associação Brasileira da Propriedade Intelectual (ABPI), Gustavo Leonardos.

A ABPI propõe que seja fixada uma indenização mínima de três mil vezes o valor do produto falsificado para quando não se conhece nenhum valor mínimo para estabelecer indenização. E a partir daí majorar de três a dez vezes as indenizações.